ENTRE DILEMAS E FRUSTRÇÕES, A LUTA É DIÁRIA E CONSTANTE
- Tchabana Vizon
- 28 de mar. de 2024
- 6 min de leitura
Estudo, saúde, desafios e melhores condições de vida. Estas são, na maior parte das vezes, os motivos que levam pessoas a deixarem os países de origem para encararem novas realidades. Para os caboverdeanos, principalmente, Portugal é a porta de entrada para, um novo começo e descoberta, novas experiencias e esperanças, dando assim continuidade ao legado da emigração.
Por via redes sociais, conseguimos ter uma pequena conversa com MULHERES e MÃES para sabermos um pouco sobre elas e das suas visões, viajando e comparando a educação de outrora com os desafios atuais.
A viver em Espanha e Mãe de duas meninas, Geisa Tavares sente-se grata pela educação dada pela progenitora. “A minha mãe sempre me disse que a educação e o conhecimento são os melhores caminhos” lembra, confessando que este concelho tem servido como guia de orientação para ser “mulher e Mãe que é hoje”.
Questionado sobre a “rigidez” de antes, traçada por muitas negações em relação às meninas, a mulher da zona de Eugénio Lima (praia) defende que nunca se sentiu condicionada. “Cresci numa casa onde todos faziam de tudo em termos domésticos. E minha mãe me deixava sempre sair para me divertir” conta ao TCHABANAVIZON, sem ignorar o fato de que muitas amigas do seu tempo não tinham esta liberdade, e por isso ela era apelidada de “bandida”.
Sendo Mãe de duas meninas, recai sempre a preocupação de educar, mantendo ou preservando certos valores. Aos 40 anos, a técnica de contabilidade e administração assume que é defensora de “xinta di pé fitxadu”, “tapa bu corpo”, mas que a ansiedade e o medo da realidade social atual, em relação às filhas, diminuem à medida que assiste podcasts, noticias e profissionais a falarem do assunto. “Acredito que a sociedade e os “homens” já respeitam mais”.
Quanto à temática da traição(H Vs M) e a maneira como se julga e condena facilmente as mulheres, Geisa admite que o “feminismo veio equilibrar a balança”, mesmo que ainda existem muitas mulheres submissas. Acrescenta ainda que é ”preciso valorizar mais e reconhecer melhor o papel da mulher que muitas vezes, está sim em casa, enquanto o homem está na empresa a trabalhar ou a construir. “A nossa rebeldia vem daí, porque estamos fartos de ser tratados como opção B”, realça.
Sabendo que a gravidez pode ter seus momentos menos bons, e que “ser Mãe” exige tempo e disposição, Geisa destaca a opção de “ser egoísta”, algo que teve maior necessidade de fazer na segunda gravidez. “Deixo as meninas aos cuidados do pai e vou correr, sair com amigos, aproveito também muito a minha própria companhia. Na altura da primeira gravidez foi difícil, mas já na segunda consegui “arranjar” mais momentos "meus". Tenho sido melhor Mãe quando comecei a cuidar mais de mim” conclui Geisa, ela que viajou para lisboa em 2005.

Em uma situação diferente está Vironice Lopes. Ela que se desafiou a deixar a casa dos pais, em Fonte Lima (Assomada),em 2011, para estudar e se descobrir. Mas, mal sabia que, para além do tempo escuro e triste que encontrou quando colocou os pés em lisboa, ela ia viver fortes emoções a níveis pessoais.
A caminhada desta jovem, de 32 anos, que tem o curso profissional de técnico de gestão, foi sempre agarrar oportunidades. “A vida foi me dando hipóteses de ver que nem tudo era aquilo que parecia, a começar pelo meu estágio, que supostamente eu ia servir café.
Com 3 meses de aprendizagem, tive a chance de integrar numa equipa fantástica, de crescer e ter uma carreira” salienta. Por ser determinada, Vironice concilia a profissão com o lado de empreendedora, algo que surgiu na pandemia e que quer dar continuidade. “No escritório atual onde trabalho, há um ano e meio, como assistente de direção financeira, também sou consultora de beleza Mary Kay. Comecei em 2019, na época que muitas empresas estavam a fechar, me desafiei a arranjar uma outra fonte de rendimento.
O que, inicialmente, era uma ideia para ganhar um €xtra, tornou-se mais tarde, numa paixão. Adorei os produtos e a filosofia da empresa e nunca mais parei” conta, mostrando otimista quanto as dificuldades de conciliar a profissão, investir no seu negócio e cumprir com o papel de ser mãe e educadora. E é desta “missão” que Vironice recorda emotivamente dos vários momentos vividos, a partir de 2016, o ano que foi Mãe e sentiu obrigada a “SER FORTE” por ela e pela filha. “Ainda lembro como se fosse hoje, quando o médico me disse a frase que ainda ecoa no íntimo"A TUA FILHA TEM UMA DEFICIÊNCIA PARA A VIDA TODA”, sublinha, antes de detalhar que a "pequena", agora com 7 anos, “ teve um trauma muito grande ao nascer e ficou com paralisia do plexo braquial (lesão no nervo do braço esquerdo). Seguiram-se noites mal dormidas, ansiedade, terapias, cirurgias e uma separação (com o pai da criança) pelo meio. “Eu só queria o conforto da minha mãe mas eu estava sozinha. Tinha de cuidar de mim, dela e, inicialmente, do pai também. Faço tudo para que ela tenha uma vida tranquila e se sinta normal no meio das outras crianças” desabafa, lembrando com apreço os que apareceram e apoiaram depois. “Pelo caminho conheci pessoas fantásticas, que me acolheram e me deram forças. Nunca tive os meus por perto mas de longe me fizeram sentir que nunca estava sozinha.
E durante estas lutas todas, eu sempre trabalhei, estudei e não abandonei o negócio de beleza” destaca. Apesar de olhar para o futuro com o nó na garganta, por causa da condição da filha, e ciente das semanas preenchidas que se seguem e ter de desdobrar-se como “mãe solteira”, Vironice não pretende baixar os braços. “Vou dar o meu melhor para prepará-la para o mundo e para esta sociedade cruel. Digo sempre que ela pode ser o que quiser, que ela é importante e que deve se valorizar. Também tento passar algumas dicas de como e no quê gastar o dinheiro, mas fundamentalemente, é que ela nunca perca a essência” confessou a mãe que se autointula de bâbada e “ramantchada”, sublinhanho estar no tempo certo, em relação ao relogio social. “Acredito que tudo acontece conforme o tempo de Deus. Se eu queria estar “mais avançada”, com a minha licenciatura feita e ganhar €5000 mensais?obviamente que sim... Mas por agora estou bem e feliz”.
Já para a Elisângela, que saiu de cabo verde com 20 anos, Portugal, hoje, não é sinónimo de vida melhor mas sim de muitas interrogações e preocupações. “Cheguei nova, vim para estudar mas, infelizmente, e igual a maioria, não acabei o curso por motivos financeiros” lamenta.
Assim como estes aspetos económicos empurraram-na para trabalhos que não gostava, pois tinha que pagar as suas contas, a jovem, grávida de mais um menino, tenta se (re)encontrar no meio de tantas perguntas sem respostas a níveis emocionais que a acompanham desde a infância. “Nunca tive presença do meu pai. Ela e a minha Mãe se separaram quando eu era criança” lembra, sublinhando que talvez o fato da Mãe preocupar tanto em não deixar faltar nada em casa, faltou o mais importante. “O amor, a presença, as orientações” recorda tristemente.
Por outro lado, e apesar de cada vez mais ouvir relatos assustadores de Mães que criam filhos sozinhas e outras que usam filhos como “objetos de vingança”, Elisângela considera ser uma sortuda por ter conseguido criar uma base sólida com o marido, o que considera ser fundamental para uma boa relação familiar. “Tenho um homem/marido a 100% e é extraordinário. Não sei como é criar filhos sozinhos, mas julgo q é uma tarefa de heroína. Penso que cada um defende os seus motivos, mas acho as pessoas(adultas) não deviam usar os filhos para se vingarem de uma relação que falhou. Filho é filho”, destaca, antes de levantar o véu sobre o curso que tem paixão e deseja fazer. “ auxiliar de ação educativa” porque adoro trabalhar com crianças.
Sem mágoas ou rancores do passado, o foco da Elisângela está em mudar e escrever novos capítulos porque considera que tudo é aprendizado. “Quem sou eu para sentenciar os meus pais ou aquilo que me deram(ou não). Podia ser diferente sim, mas prefiro aprofundar no auto-conhecimento, na educação emocional, e criar um ambiente harmonioso para a criação dos meus filhos, refletir e lutar”, finaliza.
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